Afinal, o São Paulo finalmente conseguiu a “cara de campeão” que tanto busca ou ainda falta algum espaço para preencher neste time?

O que a França bicampeã do mundo tem a ver com o São Paulo FC?

Afinal, o tricolor finalmente conseguiu a “cara de campeão” que tanto busca ou ainda falta algum espaço para preencher neste time?

Empolgou? Não, muita calma! O São Paulo pode até estar vivendo uma boa fase, mas longe de comparar o time de Cuca com a França bicampeã mundial na Rússia, em 2018. Toró não é nenhum Mbappe e Antony, apesar do nome, está longe de ser um Griezmann. Entretanto, estes dois, assim como os demais atletas do São Paulo e da seleção francesa, jogam um futebol que é taticamente muito parecido.

E estas semelhanças não se restringem apenas ao tricolor. Muitos times adotaram esta formação com pontas mais participativos e tornaram as beiradas do campo nas jogadas mais perigosas de suas equipes. Mas, como estamos em um blog são-paulino, vamos limitar os comentários ao nosso clube bem amado.

Perto de completar 30 anos, me lembro bem da seleção brasileira pentacampeão mundial, em 2002. O time de Felipão, seguindo a escola gaúcha, chegou ao título com uma equipe que jogava para frente, mas não abria mão de seus três zagueiros. Uma novidade para uma seleção com jogares tão talentosos no ataque. Anos mais tarde, o 3-5-2 se transformou em um esquema amplamente utilizado em nosso país. Prova disso é que nossas glórias no memorável ano de 2005 vieram com Lugano, Fabão e Edcarlos (sendo Alex o titular da campanha na Libertadores).

Em 2006, a Itália, famosa por seus exímios defensores, levou a Copa do Mundo e ratificou o bom momento do futebol defensivo. Apesar de não jogar com três zagueiros, a Itália tinha um sistema sólido e o “muro Cannavaro” não foi eleito apenas o melhor jogador do mundial, mas também vencedor do prêmio de melhor do mundo da FIFA daquele ano. De quebra, Cannavaro sagrou-se o primeiro zagueiro a conquistar tal façanha. Enquanto isso, no Brasil, a hegemonia dos três zagueiros continuava. E foi com o 3-5-2 que fomos tricampeões brasileiros em 2006, 2007 e 2008.

A Copa do mundo na África do Sul, em 2010, adicionou a Espanha no rol de campeões. A herança deixada pelos espanhóis foi o tiki-taka. Antes mesmo da seleção mostrar ao mundo a sua envolvente troca de passes e posse de bola esmagadora, o Barcelona de Pep Guardiola já brilhava ao jogar deste mesmo jeito. Com a base da Fúria composta alguns dos craques do time catalão, a Espanha de Vicente del Bosque não teve dificuldades em implantar o mesmo estilo de jogo.

No resto do mundo, os times passaram a copiar o modelo, já que tanto o Barcelona quanto a própria seleção espanhola continuavam a erguer taças. Mas apenas a posse de bola não ganha jogo. Os times menores, quando enfrentavam os grandes, passavam a jogar pela famosa “única bola”, explorando os erros do adversário. O tiki-taka exigia que os pontas voltassem pra marcar os avanços dos laterais adversários e também para garantir a rápida transição do campo de defesa para o ataque.

Sessenta e quatro anos após o famoso Maracanaço, em 1950, o Brasil voltava a receber uma Copa do Mundo. A euforia estava nas alturas e a conquista do hexa jogando em casa contagiava os brasileiros. Mas o que aconteceu em 2014 ainda está fresco na memória de todos e dói até hoje. Depois da Alemanha aplicar acachapantes sete gols na semifinal contra o Brasil e bater a Argentina na final, o vestibular para falso 9 foi o mais concorrido da Fuvest naquele ano e a Catho Online registrou um número recorde de centroavantes de ofício buscando novos empregos.

O falso 9 consiste em povoar o meio de campo para ter maior posse de bola e permitir que um jogador de trás chegue à área com boas chances de finalizar. Para isso, é importante a participação dos volantes no jogo. E aquela seleção alemã contava com a dupla Khedira e Toni Kroos, ambos com muita habilidade para distribuir passes. O volante não poderia mais ser apenas aquele carniceiro que mata as jogadas. O centroavante, por sua vez, passou a sair mais da área para buscar o jogo e abrir espaços para os meias também pisarem na casinha.

A Copa da Rússia e seus reflexos no futebol de hoje

Como uma nova Copa sempre deixa seu legado, coube à França transformar o 4-3-3 em sensação. Como num passe de mágica e quase sem perceber, esse esquema se tornou o mais popular no futebol atual. Poderíamos passar horas dando exemplos, como Griezmann-Messi-Soares, Mané-Salah-Firmino, Neymar-Mabappe-Cavani, até chegar ao nosso atual Anthony-Pato-Pablo (se assim o nosso Departamento Médico permitir…). Há pouco tempo, a realidade com Diego Aguirre era Everton-Rojas-Diego Souza. Jogadores diferentes, técnico diferente, mas esquema similar.

No entanto, analisando o elenco são-paulino, podemos dizer que o clube adotou o 4-3-3 em virtude das joias de Cotia. Eles reúnem aquilo que o jogador brasileiro tem de melhor: explosão, rapidez, agilidade, drible, criatividade. Adjetivos não faltam para jogadores como David Neres, Luiz Araújo, Antony e Toró. Além de bons de bola, são excelentes fontes de receita para o clube.

Mas será que o 4-3-3 é mesmo o melhor estilo de jogo para o São Paulo? O leitor já deve ter percebido que em muitos jogos o time deixa de criar exatamente por haver um buraco no meio de campo. Quando o São Paulo tem o domínio da bola, o jeito é sempre abrir para um ponta tentar o jogo pelos flancos, na espera de um centroavante bem colocado para finalizar. E por vezes foi assim que o tricolor chegou a importantes vitórias em 2019.

Mas no mundo da bola as coisas nem sempre acontecem como previstas. A realidade do time são-paulino é o domínio da posse de bola, mas pouca definição. Contra um adversário bem postado, nossos pontas ficam sem alternativas de jogo pelas beirados do gramado e, em vão, recorrem a um companheiro pelo meio.

Começamos o ano com Nenê, Everton Felipe, Igor Gomes e Hernanes na posição. Nenê vivia má fase e foi negociado, Everton Felipe é preterido pela comissão técnica, Igor Gomes recebe poucos minutos por jogo e Hernanes está em um relacionamento sério com o Departamento Médico. Com isso, coube ao recém-contratado Vitor Bueno o papel de armador. Mas este, apesar de decisivo em um jogo importante, parece ainda estar longe de convencer.

Neste cenário, a função de organizador recai sobre jogadores que não são meias de ofício. Daniel Alves, jogador mais vitorioso da história do futebol, chegou para atuar como meia. Everton, que por sua vez também convive com sérias lesões, é um dos que fazem o papel de camisa 10 na ausência de um atleta da posição. E, assim como Daniel Alves, cai de rendimento quando descolado para o posto.

Se encontrar um meia é difícil, encontrar uma dupla de meias parece missão impossível. Ao analisar outros times, a impressão que temos é de que a figura de um meia clássico está cada vez rara no futebol brasileiro e mundial. A alternativa parece encher o time com jogadores velozes, que dão rapidez ao ataque, mas que não pensam a partida como pensa um legítimo armador. Neste caso, opta-se por preencher este vazio com quem tem à disposição.

Não podemos esperar mais três anos para que a próxima Copa do Mundo, realizada no Catar, revele um estilo de jogo com mais raciocínio e ação. Do contrario, perante as restrições técnicas e médicas que o São Paulo tem em seu elenco atual, não restará outra escapatória para a equipe senão uma saída à lá francesa: pelos lados.